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Comum, apresente-se.

Outra vez com falta de ar, abro bem a boca, puxo o ar até chegar nos pulmões e a dor indicar que o prendi ali por tempo maior que o necessário (repito por vezes, como se eu fosse me convencer de estar respirando ou sei lá). 

Eu diria que a sala está vazia, mas não é verdade. Meus pais estão no quarto e minha irmã também, mas há alguém aqui (e há mais coisas em mim também, inclusive no lugar em que eu deveria estar). 

Há poucos minutos a televisão iluminou o sofá maior que supunha-se estar desocupado, mas o que apareceu num jogo de luz foi uma garota, vi seu corpo e sua roupa, estranhamente sua cabeça não entrou em meu campo de visão, o que fez o susto quase que incompleto. Suas pernas eram compridas, sua roupa clara e convencional. A propósito, ela parecia estar mais a vontade do que eu, com seus pés no encosto do sofá como quem se entretém satisfatoriamente. Como que acostumada com minha companhia, também, ela não pareceu estranhar ser observada por mim e permaneceu ali. Desviei o olhar e fiz que nada havia acontecido – e quem me garante que aconteceu ou não?

Não é nada. Nunca é nada. E eu não sei quando é que seria diferente disso.

É que eu não sei mais o que seria normal ou não, o que é o normal? Inicio conversas com “prova que acordei, me prova que estou aqui” e não chego a lugar algum. Olha, eu não sei o que está acontecendo (e não sei se o que está acontecendo é ou não é comum por que, o que seria comum?).

Não é que eu esteja mergulhada na fantasia, é que eu não me acho dentro ou fora dela, sigo sem saber dela e sem saber de mim.

 

Convença-me!

É muito fácil se perder em universos paralelos, são tantos!

Até o ar parece estar mais resistente, se opondo a entrar em meus pulmões e me deixando com a respiração falhada.

O pulso ainda pulsa, preguiçoso, numa lentidão que transparece o cansaço, sem motivação e sem credibilidade. 

Os olhos não piscam normalmente, esgazeados, levando não poucos minutos para perceber que não vejo nada do que encaram.

A zonzeira não é só mental, a labirintite eleva o grau das coisas parecerem girar, girar e girar mas só. Até eu cair como ontem.

O céu parece só um véu que cobre as coisas, abafa o cenário e não nos deixa escapar para o que tem depois dele.

A mudança de lugares parece troca de cenários, imposta numa tentativa fajuta de distração.

Os edifícios, as estruturas, até móveis e eletrônicos, parecem que sem demora vão se dissolver – mas demora, só que a ansiedade me dá o feedback de que continuo na espera.

Fico atenta ao vento, as vezes acho que com ele as coisas vão quadricular, dar aquela pausa ou só travar como numa transmissão via satélite que perde o sinal, um problema de conexão ou coisa assim.

Ser uma pessoa tem se tornado demasiado complicado, perdi o senso do certo e do errado, já não sei mais o que é convencional e o que não é, a normalidade não faz sentido ou eu que não sei senti-la, estar acordado em muito se parece com estar dormindo, a ilusão pode ser real, a existência não me convence de sua verossimilhança.

Encaro o espelho, vejo um borrão esfumaçado, um vidro, uma massa de pão – vejo o que for, nada vejo.

As vozes dos que estão próximos a mim não são apreendidas, levo tempo demais para perceber que tenho de responder e formar uma resposta, ou só o faço sem saber que o fiz – depois me questiono: “O que eu disse? Disse? Ou só pensei em dizer?”

Não é bem como estar no piloto automático, é mais como não saber onde se está e o que é que seria. Eu não faço ideia do que está acontecendo porque, na verdade, eu não acredito que esteja acontecendo de fato.

Eu não me vejo aqui. 

Queria parar com isso de vez, mas parar com o quê? É necessário que se tenha uma vida para tirá-la, eu não acredito que esteja viva. Mesmo.